Concurso literário: desleal à etiqueta

O dia já ia longo quando, por fim, D. Leonor chegou à Aldeia Galega, onde iria passar a noite e, logo pela madrugada, partiria em direção a Caldas da Rainha.

O cavalo abrandou a marcha. O cocheiro murmurou algo para o animal e o mesmo voltou a andar mais depressa. A carruagem balançou um pouco e D. Leonor suspirou. Seu marido, D. João, desta vez, não a acompanharia até Caldas da Rainha. O rei tinha mais em que pensar e fazer em Lisboa, pensou D. Leonor.

O cavalo relinchou e a carruagem parou. Em rápidos instantes, a porta foi aberta mostrando o cocheiro que fazia uma vénia à Rainha.

– Seja bem vinda, Majestade. – falou o cocheiro, dando a mão a D. Leonor. A rainha limitou-se a concordar e sorrir rapidamente.

Olhou à volta e percebeu que algumas pessoas que passavam por ali paravam para fazer vénias. D. Leonor correspondia com um ligeiro sorriso.

– Majestade! – uma jovem falou fazendo uma longa vénia. – D. João contratou-me como sua aia. Estarei sempre ao seu dispor, minha senhora.

– Muito obrigada…

– Alice, senhora. – completou a aia.

– Alice. – continuou. – Onde irei ficar esta noite?

– No solar da aldeia. – Alice respondeu olhando D. Leonor. – Precisa de ajuda com a sua bagagem, senhora?

– Não é necessário Alice, o Artur trata disso. – D. Leonor respondeu fazendo sinal ao cocheiro para que este levasse a sua bagagem até ao solar.

Alice indicou o solar a Artur e o mesmo foi em direção à casa.

– Diz-me Alice, porquê tantas decorações na rua? – a rainha falou movendo a cabeça e apreciando as decorações festivas.

– É a festa da aldeia, senhora.

  1. Leonor concordou com a sua aia e seguiu-a em direção ao solar onde Artur esperava com a bagagem. A rainha entrou e aqueles que se encontravam na entrada principal do solar não perderam tempo em fazer uma vénia à rainha.

Uma senhora aproximou-se demais da rainha e ajoelhou-se, beijando os pés de D. Leonor. A rainha, incomodada com tal situação, mandou que erguessem a mulher que falava algo baixinho enquanto chorava.

– Deixe-me indicar o seu quarto, majestade. – a aia falou indo em frente até a umas escadas que davam ao local onde D. Leonor ficaria alojada.. A rainha subiu cautelosamente cada degrau. A aia, num passo mais apressado, entrou no quarto. D. Leonor entrou passando o olhar por cada canto do seu “ novo quarto”. Não era como o seu quarto em Lisboa, mas não era mau de todo, refletiu a rainha. Podia ser pior, concluiu.

– Espero que esteja tudo do seu agrado, minha senhora. – Alice falou despertando a rainha para o que estava acontecendo.

– Sim, está tudo do meu agrado. – disse D. Leonor, sorrindo.

– Vou deixá-la descansar, senhora. Com licença, pediu a aia saindo e fechando a porta. D. Leonor sentou-se num cadeirão que estava em frente à janela aberta. A brisa fresca da tarde enchia o quarto.

Uma melodia dançava no ar chamando a atenção da rainha que descansava no cadeirão. D. Leonor reconheceu aquela melodia. Era a música que o bobo Henrique tocava durante as festas no castelo.

A rainha levantou-se do cadeirão e deu largos passos até à janela. Queria ver de onde vinha o som. Um artesão, calculou a rainha, ensinava o filho a tocar bandolim. O menino olhava o pai com o instrumento nas mãos ao mesmo tempo que batia palmas e saltava de um lado para o outro.

Uma padeira acompanhada por uma artesã compunham uma mesa enorme de madeira que se estendia em frente ao pelourinho da aldeia. Duas meninas estendiam uma toalha grená. Grinaldas com flores eram içadas de janela em janela criando um efeito maravilhoso. Pequenas tochas eram acesas e colocadas em vários pontos do largo.

  1. Leonor entrou novamente no quarto e foi em direção à porta. Abriu-a devagar e espreitou.

Ao lado havia um pequeno quarto. Abriu devagar a porta. Esperava encontrar um vestuário simples. Viu uma saia castanha e uma blusa. Voltou para o seu quarto.

Nesse momento, D. Leonor sentiu que ia desperdiçar todas as aulas de etiqueta que tivera em pequena. “Nunca se dê demasiado com o povo, Leonor” dizia a sua professora Melinda. A rainha trancou a porta. Vestiu-se. Havia algo que não estava bem. O cabelo. Levou as mãos até ao seu cabelo e tirou os ganchos que suportavam os seus caracóis castanhos. Pegou numa escova que estava numa cómoda e passou-a pelo cabelo e entrançou-o.

Parecia outra pessoa. Tirou os brincos e também o colar que trazia consigo. Olhou-se uma última vez ao espelho. Respirou fundo e andou até à porta. Destrancou-a e abriu-a saindo com a chave na mão. Alice apareceu nas escadas e perguntou:

– O que estava fazendo no quarto de sua majestade? – perguntou a aia a D. Leonor.

– Estava apenas a confirmar se a senhora estava bem. – mentiu, fingindo tal coisa.

– Deixe-me ver. – falou Alice, subindo as escadas.

– D. Leonor está a dormir. – mentiu novamente.

– Está bem. Venha para baixo então. A festa está quase a começar. – disse Alice pegando a rainha pelo braço.

  1. Leonor escondeu a chave no seu decote. Fazia impressão mas aguentaria. Novamente, a melodia soou no ar e D. Leonor, agora disfarçada, podia sentir a alegria habitar o seu corpo. Pegou na mão de Alice e começou a dançar ao som da música. Várias pessoas juntaram-se em pouco tempo. Começaram a apinhar-se no pelourinho e dançavam ao som da música que um grupo de bandoleiros tocava animadamente.

A noite caía em vila Galega. D. Leonor sentiu que acabara de desrespeitar a etiqueta que a sua mãe tanto prezava. Mas tinha valido a pena. Regressou ao seu quarto.

 

Texto elaborado por: Mariana Filipa da Costa Correia   | Idade: 14

 

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